Casa da Camélia, Guimarães, 2008
O terreno situa-se num ponto elevado da encosta da Penha, com uma magnífica panorâmica sobre a cidade de Guimarães e áreas envolventes. Na concepção do projecto torna-se assim relevante a procura de um sentido de cumplicidade com o lugar onde naturalmente ganhará corpo uma relação de mútua contemplação entre o edifício e a paisagem.
Procura-se a cota que permita, a partir do espaço interior, beneficiar de modo abrangente da vista sobre a cidade. A casa implanta-se a essa cota, uma cota que não existe no terreno natural. E, por isso, há que transformar o terreno, reinventando a sua topografia, moldando-o com a ajuda de extensos muros de granito que, vincando ressaltos, são já o anúncio da construção da casa, preparando o lugar que a irá acolher.
A casa é constituída por um volume geometricamente simples, pousado sobre a plataforma mais elevada (aquela que atinge a cota desejada), balançando de modo aparentemente instável sobre o último dos ressaltos.
A artificialidade deste permite que a casa se aproprie ainda do seu interior, desdobrando-se num piso inferior em contacto directo com o terreno. Um estreito pátio, aberto em toda a altura do espaço interior, faz descer a luz natural até ao centro do volume, compensando as limitações decorrentes da orientação predominante dos vãos de fachada – voltados para a paisagem, ou seja, para Poente. Um reequilíbrio que as várias entradas de luz zenital vêm consolidar. Na fachada oposta tudo se torna mais filtrado e circunstancial, desenhando a aproximação à entrada, resguardando a leitura dos espaços de serviços. E basta um volume insolitamente balançado – o do estendal de roupa – para estabelecer a correspondente hierarquia.
Na consciência da dialéctica entre natureza e artificialidade que sempre anima o acto arquitectónico, a solução aposta numa contraposição onde, no fundo, ganham expressão as identidades das duas realidades tornadas complementares por via da própria ideia de Arquitectura que anima o projecto – objecto e paisagem. No modo como se tocam e se dão a ler reinventam-se essas mesmas identidades.
Demarcando o volume através de uma extensa consola que, no sentido da paisagem, o vai libertando do muro onde pousa, o projecto procura aligeirá-lo, evitando superfícies contínuas que abranjam toda a sua altura e dando-o a ler como se de um só piso se tratasse. Simultaneamente acentuando uma sensação de instabilidade onde ganha expressão a aparente elementaridade da sua geometria.
Um volume que se desenha num compromisso explícito com a paisagem, numa sucessão de espaços interiores generosamente envidraçados e complementados por espaços de transição integrados no mesmo volume – pátios, varandas e alpendres – onde se consubstanciam as relações entre luz e sombra que, dando forma à inter-acção entre interior e exterior, ajudam a moldar a própria geometria do corpo a construir.
O espaço interior da habitação é ordenado de modo a que, tanto quartos como sala comum, beneficiem do magnífico enquadramento visual da fachada Poente, voltada para a paisagem.
A sala desdobra-se em dois espaços (estar e refeições), ambos articulados com uma ampla varanda que, constituindo seu prolongamento, dispõe de uma dimensão que lhe confere um alto grau de autonomia. Em toda a extensão da sua rectaguarda tal varanda é, ela própria, iluminada por uma clarabóia para que o Sol nela possa incidir a partir do quadrante Sul e assim compensar a natural limitação da orientação solar da fachada. Um processo de reequilíbrio que passa também pela introdução de luz natural no pátio a céu aberto disposto no centro do volume e que confina tanto com a referida sala comum desdobrada como com a sala alternativa situada no piso inferior.
Tanto a sala de jantar como o quarto principal serão ainda iluminados por aberturas em toda a altura do piso, cuja localização nas fachadas Norte e Sul procurará também responder ao propósito de decompor o volume, assim acentuando a expressão formal do balanço do corpo edificado.
Instavelmente pousada, a casa expressa esse incontornável desejo de se deslocar no sentido da paisagem, uma vontade também manifesta no ordenamento do seu espaço interior – lugar de abrigo e de contemplação.
Resta esperar pelo entardecer, pelas luzes da cidade que, no horizonte, se vão a pouco e pouco acendendo.
Arquitectura
José Gigante
Vítor Rosas da Silva
Colaboração
Fernando Santos
Projecto de Estruturas, Instalações e Equipamentos
NVE-Engenharias Lda.
Projecto de Comportamento Higrotérmico
Prof. Eng. Vasco Peixoto de Freitas, Lda.
Localização
Lugar da Costa, Guimarães, Portugal
Data de Projecto/Obra
2002-2008
Construções
GMS-Construções e Imobiliária, Lda.
Ibercarpi - Carpintaria, Lda.
Fotografia
Luís Ferreira Alves